Blues, Beat & Beer
sexta-feira, dezembro 23, 2005
  A Velha Dama de Paris

Eu imagino que Fante se sentiu, ao menos uma vez na vida, como sua personagem de Minha Primeira Viagem à Paris. Eu posso quase afirmar que, com toda a emoção e sentimento que sempre expressou em suas novelas, ele já lastimou algo, assim como aquela velha mulher. Eu tenho certeza disso. Ainda mais, Fante precisa ter tido ao menos em algum momento da sua vida, mesmo que muito brevemente, a experiência do amargo sentimento daquela mulher jogada em um cruzamento de Paris.

Pois eu já me senti assim. Da mesma forma que aquela mulher horrenda como um pesadelo, grisalha e triste como o mais forte inverno. Aquela velha como a cidade de Paris, que passava o dia como um amontoado de ossos. Abandonada como um cão velho com as horas contadas. Imóvel como a Notre Dame.

Talvez isso de alguma forma revolte as pessoas. Mesmo que seja pela impotência de não poder ajudar. Mas eu entendo a velha dama e faria a mesma coisa. Talvez alguns jogariam moedas e outros nem olhariam. Alguns pensariam em ajudar, mas no mesmo instante outra coisa mais importante lhes passaria pela cabeça.

Mas se por acaso alguma pessoa de passagem fosse parar e perguntar o que eu precisava ou simplesmente por que eu estava ali jogado como um monte de trapos velhos, eu responderia calmamente assim como a velha mulher fez: "A única coisa que eu desejo agora é ficar só, com minha dor".
 

sexta-feira, dezembro 16, 2005
  Quel Bordel Putain de Merde

"Quel Bordel Putain de Merde", dizia o velho homem curvado pela idade e pelo duro trabalho na antiga fábrica de rádios AM. Como se não bastasse o calor de 35 graus, M. Delatrouille ainda portava um casaco de lã, feito certamente para o mais rigoroso inverno. Ele sai do apartamento onde morou há mais de 50 anos, em direção à casa de seu ex-patrão, o M. Piègeaux.

Chegando lá ele esmurra a porta da forma que pode, já que a fraqueza da idade não lhe deixa expressar todo seu rancor. A porta se abre e é seu ex-patrão mesmo que aparece com a cara de quem não tem muitos amigos. M. Piègeaux o analisa com os olhos, dos pés a cabeça e diz com um ar de desprezo:

- Que est-ce que vous voulez ici M. Delatrouille.
- J'ai une choise pour vous M. Piègeaux.

De um só golpe, M. Delatrouille puxou do interior de seu casaco uma pistola que ele guardava como medalha pela sua atuação não reconhecida durante a Segunda Guerra e deixou a arma a 30cm do peito de seu maldito ex-patrão. A cena foi tão violenta aos olhos de M. Piègeaux que o velho ex-patrão desmoronou, morto de ataque cardíaco, como um prédio sendo implodido.

M. Delatrouille virou as costas para o defunto esticado no tapete de entrada da casa. "Quel Bordel Putain de Merde", disse ele com um ar aliviado do fardo pesado que ele carregou durante mais de 40 anos.
 

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Christon Delàs
christon.delas@yahoo.com

"It comes blundering over the
Boulders at night, it stays
Frightened outside the
Range of my campfire
I go to meet it at the
Edge of the light."
Gary Snyder
(How Poetry Comes to Me)

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